Fragmentos de Ana Cristina Cesar
PsicografiaTambém eu saio à revelia
e procuro uma síntese nas demoras
cato obsessões com fria têmpera e digo
do coração: não soube e digo
da palavra: não digo (não posso ainda acreditar
na vida) e demito o verso como quem acena
e vivo como quem despede a raiva de ter visto
Poesiajardins inabitados pensamentos
pretensas palavras em
pedaços
jardins ausenta-se
a lua figura de
uma falta contemplada
jardins extremos dessa ausência
de jardins anteriores que
recuam
ausência freqüentada sem mistério
céu que recua
sem pergunta
Flores Do MaisDevagar escreva
uma primeira letra
escreva
nas imediações construídas
pelos furacões;
devagar meça
a primeira pássara
bisonha que
riscar
o pano de boca
aberto
sobre os vendavais;
devagar imponha
o pulso
que melhor
souber sangrar
sobre a faca
das marés;
devagar imprima
o primeiro olhar
sobre o galope molhado
dos animais; devagar
peça mais
e mais e
mais
Deus na AntecâmaraMereço (merecemos, meretrizes)
perdão (perdoai-nos, patres conscripti)
socorro (correi, valei-nos, santos perdidos)Eu quero me livrar desta poesia infecta
beijar mãos sem elos sem tinturas
consciências soltas pelos ventos
desatando o culto das antecedências
sem medo de dedos de dados de dúvidas
em prontidão sangüinária(sangue e amor se aconchegando
hora atrás de hora)Eu quero pensar ao apalpar
eu quero dizer ao conviver
eu quero partir ao repartirfilho
pai
e
fogo
DE-LI-BE-RA-DA-MEN-TE
abertos ao tudo inteiro
maiores que o todo nosso
em nós (com a gente) se dandoHOMEM: ACORDA!
Um Beijoque tivesse um blue.
isto é
imitasse feliz
a delicadeza, a sua,
assim como um tropeço
que mergulha surdamente
no reino expresso
do prazer
Espio sem um ai
as evoluções do teu confronto
à minha sombra
desde a escolha
debruçada no menu;
um peixe grelhado
um namorado
uma água
sem gás
de decolagem:
leitor ensurdecido
talvez embevecido
"ao sucesso"
diria meu censor
"à escuta"
diria meu amor
sempre em blue
mas era um blue
feliz
indagando só
"what's new"
uma questão
matriz
desenhada a giz
entre um beijo
e a renúncia intuída
de outro beijo.
Minha boca também
está seca
deste ar seco do planalto
bebemos litros d'água
Brasília está tombada
iluminada
como o mundo real
pouso a mão no teu peito
mapa de navegação
desta varanda
hoje sou eu que
estou te livrando
da verdadete livrandocastillo de alusiones
forest of mirrorsanjo
que extermina
a dor
Acreditei que se amasse de novoesqueceria outrospelo menos três ou quatro rostos que ameiNum delírio de arquivísticaorganizei a memória em alfabetoscomo quem conta carneiros e amansano entanto flanco aberto não esqueçoe amo em ti os outros rostos
Poemas daqui
1 - Biografia Sucinta
Ana Cristina Cruz César, nasceu no Rio de Janeiro em 2 de junho de 1952, tendo, desde cedo, demonstrado talento e gosto pela arte de escrever. Já em 1959, tinha as primeiras poesias publicadas no “Suplemento Literário” da “Tribuna da Imprensa”. Foi Licenciada em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, em 1975, obtendo o grau de Mestre em Comunicação, pela Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1979 e Master of Arts in Theory and Practice of Literary Translation, pela Essex University, na Inglaterra em 1980.
Ana gostava profundamente de escrever. Além de suas inumeráveis poesias e cartas, escreveu para diversos jornais e revistas e traduziu diversos autores estrangeiros. Entre esses autores, inclui-se a poetisa americana, Sylvia Plath, que da mesma forma que Ana César faria mais tarde, colocou um fim à sua própria vida.
Ana C. morreu em 29 de outubro de 1983 e, com certeza, pela sua juventude e beleza, pelo conteúdo e forma de sua obra, pela interrupção brusca de sua vida e do seu talento, tornou-se um símbolo e um ícone. Quando a vida segue o seu curso normal, as pessoas têm tempo de se preparar para a passagem daqueles que, de alguma forma, têm parte ou influência em suas vidas. Isso não acontece, em casos como o de Ana César, onde a ruptura abrupta sempre deixa o único recurso de uma saudade brutal ou de uma veneração desmedida. De qualquer forma é importante a noção, e o consolo, de que as pessoas se perpetuam, nos corações e nas almas, pelo que deixam, na forma de obras materiais, como é o caso de Ana César, ou através das lembranças de atitudes, palavras ou gestos, que podem fazer melhor a vida dos que ficaram.. Dentro dessa ótica pode-se entender o seguinte poema:
AusênciaPor muito tempo achei que ausência é faltaE lastimava, ignorante, a falta..Hoje não a lastimo.Não há falta na ausência.Ausência é um estar em mim.E sinto-a tão pegada, aconchegada nos meus braçosQue rio e danço e invento exclamações alegres.Porque a ausência, esta ausência assimilada,Ninguém a rouba mais de mim.(Carlos Drummond de Andrade – Com o pensamento em Ana Cristina)
Biografia daqui
Parabéns.Amo Ana Cristina,que tem uma obra de rigor poético,de busca mesmo de uma "perfeição".Uma das últimas poetas grandes que tivemos.Que pena que se foi tão cedo!(Amiga do nosso querido Caio F.).Belo post!Um beijo.
ResponderExcluirSe tudo que você quer é não querer mais, tudo o que você pode fazer é esperar enquando a ausência fria e pretensiosa deixa o seu caminho um pouco mais difícil. Será que seria mais fácil se tudo fosse mais fácil? Não sei. Só sei que seria muito menos interessante.
ResponderExcluirGosto tanto da Ana Cristina Cesar que peguei emprestado o livro A Teus Pés. Meu irmão comprou esse livro num Sebo e eu li e peguei pra mim. Até hoje meu irmão me pede de volta, mas ele sabe que é meu livro de cabeceira. Aliás, um deles.
ResponderExcluirO que me leva a ler e reler os textos dela é exatamente o formato e a voz. Ela dialoga e não impõe. Seus versos não se fecham como em poemas tradicionais. E há quem diga que nem poemas ela escrevia. Ela narrava em textos picotados o que tanto esconde nosso pensamento. É um exercício literário e humano ler Ana Cristina Cesar. E tem mais. Não há marca sexista. É unissex o que ela diz. O amor e o medo são de todos. Eu adorei o post, Du.
Beijos. =)
Não conhecia essa poetisa, e muito triste por ela ter partido tão nova e que obra maravilhosa que deixou.
ResponderExcluirParabéns filha exelente homenagem.
Beijos e beijos!
Obrigada pelo seu carinho de sempre!
Você sabe que eu não sei comentar poesia, já disse várias vezes que eu acho a poesia algo tão pessoal , tão particular que penso que não devo me envolver.
ResponderExcluirMas a história dela é muito interessante.
Qualquer coisa pode falar que vou correndo,ok?
Beijão do amigão!
Oi Du saudades de vc.
ResponderExcluirDá uma olhadinha no blog http://entrementesentretantos.blogspot.com/
E olha a surpresa q o zisco fez para mim.
Um bjão.
Duzinha,
ResponderExcluirVc é uma artista!!! Só posta coisas lindas,deveria escrever novelas.Vai dar audiência!!!!AMEI!!!!!Beijos e, me dá um autógrafo???????
Eu acho que já te disse o quanto eu gosto dessa poeta. Sua poesia me desnuda a pele, sabe?
ResponderExcluirjardins inabitados pensamentos
pretensas palavras em
pedaços
jardins ausenta-se
a lua figura de
uma falta contemplada
jardins extremos dessa ausência
de jardins anteriores que recuam
ausência freqüentada sem mistério
céu que recua
sem pergunta
Descobri esta grande mulher apos a sua morte, quando lia um artigo na revista do Jornal do Brasil, tinha apenas 13 anos, mas fiquei intrigado com a foto daquela mulher de oculos escuros que demonstrava um olhar além mar, além vida.
ResponderExcluirAinda tinha esta revista a alguns anos atrás, mas infelizmente não sei onde coloque. Vou tentar achar e postar futuramente.
Para Ana C.
ResponderExcluirPor: Elizeu MC
Domingo de 1983
Li um artigo em uma revista
Pude ver os olhos de Ana
Olhos de cristal ...
...Pedra cristalina
Através dos óculos escuros
Pude ver seus olhos
Olhos de menina
Os olhos que me fascinam
Além mar..
..Além vida
Minha inspiração...
..Ana Cristina.
Que fina ironia Ana C. punha em sua poesia, que sentimentos, um sutil limite entre autobiografia e ficção!
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