Fragmentos de Glória Diógenes ~ @gloriadioge

11:47 Dulce Miller 2 Comments

Glória Diógenes tem um blog, o Linhas ao Vento, onde escreve textos lindos e emocionantes, como "Dirceu de Marília" que coloquei abaixo da imagem. Também escreve poesia em 140 caracteres no Twitter -> @gloriadioge. Não deixem de prestigiar esta querida que escreve com a alma na ponta dos dedos, literalmente.



Dirceu de Marília

Dez minutos foram suficientes. Esse absurdo cálculo dos instantes que não constam nas horas. Ela olhou o relógio assim que entrou na estação. O próximo trem logo apitaria e anunciaria redenção. Sair de um lugar leva tempo. Marília antevia o alvoroço dos dias. Ela não arredaria. Nem a alcunha de louca da torre, nem as janelas fechadas com sua passagem a conduziriam para longe da paisagem. O amor é o risível do medo. Quando Antônio se foi, carregou consigo a poesia que cada dia batia à porta da mulher amada. A hora era aguardada. Marília se enfeitava, banhava-se com água de colônia, escovava os longos cabelos e acendia o olhar. Muitos seriam capazes de jurar que havia uma alquimia nos versos que recebia. Ela entreabria o papel, suavemente, passava a língua na resina do envelope dobrado e mastigava letras amorosas em pratos fartos de lira. Mulher quando se sente amada risca sorriso sem motivo nos lábios. Quem acompanhava o farfalhar de suas longas saias subindo ladeiras, podia pressentir o amor que lhe subia às faces. Ela era farta. Ninguém ousaria apontar a loucura que já se instalava, sorrateira, nesse diálogo inexistente. Apenas Antônio fala. Como uma mulher suporta a ausência de um amor que se cala? Loucura deve ser um deserto de palavras de rumo certo restando apenas fragmentos de poesia. Marília soltou os cabelos, deixou o olhar vagar para além da Vila e se vestiu com túnicas soltas ao vento. Seu homem partiu em um barco à vela mesmo sendo eternamente dela. O tempo é tão mensurável quanto o curso de um rio. No alto da estação, letreiros marrons, em alto-relevo indicavam o destino do viajante – Mariana. Ele pularia do trem, tomaria as mãos da mulher já tão cansadas de apertar dedo por dedo e as conduziria até seus lábios quentes. Dez minutos podem unir continentes, mesmo que um trilho imaginário atravesse oceanos. Ela desfez a trança que entremeava os cabelos dourados, deitou-se no banco de madeira ao lado do trilho e fechou os olhos. A Maria-Fumaça estava exaltada naquele dia, fazendo mais alarido que o baticum do coração de Marília. O trem parou e ela continuou deitada por sobre o banco, derramando todo o tempo de espera e de fome. Desespero é palavra que se usa quando nenhum sentimento resolve. Passaram-se um, dois, três, dez minutos e ele não a conduziu de volta à sua encantada lira. Antônio cruzou a África e nunca mais voltou. Dizem que casou com a filha de um mercador de escravos. Pouco importa. Ela continua viva e sem nenhum sinal de onde espera, de onde mora. Os poemas de Antônio vagam por todas as bocas. Marília permanece nos refrões que compõem cada lira de Dirceu. Ela, nunca mais soube dela. Seria isso que chamam de loucura, essa morte em versos?

Para Marília de Tomás Antônio Gonzaga e para todas as mulheres que tiveram seus versos partidos

Glória
Vivo para além da lógica amigo "versus" inimigo. Da perversa lógica da guerra. Somos diferentes, isso diz tudo.
A vida pode engasgar, ser difícil de digerir, caso a vontade de retê-la sobreponha-se à experiência diária de sorvê-la
me calma vento. na rede com varandas escrito o meu nome. ausento-te.
um segredo soprou tua presença. não há lugar para quem partiu. escutou?
brincar. sentar no chão. imaginar. saber-se tantos de brinquedo. eu acumulo todas as idades que tenho.
Amar é o modo mais fácil de nunca morrer
Liberdade é desejo de peso, de preso, de opressão. Quem é livre só quer mesmo é viajar
São Longuinho é para coisas perdidas. Qual o São para dar paradeiro a coisas achadas?
anseio por um tempo fora dos cronômetros, eu então me entegaria ao enlace entre escritura e desejo
Atenção - você acredita que o virtual não é "real"? , que a técnica difere do pensamento? Bom ler Lévy - "As tecnologias da inteligência"
Hoje acordei Drummond "A vida não me negou nada, e eu mesmo lhe pedi pouco".
Um bom dia, com o grito histórico adaptado - Independência ou....não tem outra opção aí não? #humor
O sonho intenso permanece indelével na memória, transcende o acontecimento
Não se avexe não. O desejo desconhece o tempo.
O passado não tem memória, fixa-se no tempo presente. Refazendo o ido e o vivido.
Mãos se beijam no silêncio, bocas se abraçam, pernas se olham. Infinitos são os prazeres do corpo.
Tua ausência plantada no meu deserto #fantasma
Para uma geminiana típica, escrever e, ao mesmo tempo, dar uma olhada no que acontece por aqui faz tudo ficar mais leve
Teu P.S. de fim - Abençoados os que amam no silêncio!
Era bela a manhã que despontava na noite. Tinha teu rosto cravado na luz do sol

2 comentários:

  1. Fui prestigiar pessoalmente. Sem dúvida uma grande escritora.

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  2. A Glória escreve...
    Da alma para o papel...
    Sem itermediários...
    Literatura pura!

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